quinta-feira, 29 de outubro de 2009

OS OSSOS DE QUE É FEITA A PEDRA - Visões Úteis



inaugura a 31 de Outubro 23h

ESPAÇO GESTO - rua Cândido dos Reis, 64 Porto

OS OSSOS DE QUE É FEITA A PEDRA
Aos primeiros raios de sol, o homem riscou na terra um quadrado perfeito e começou a escavar. Moveu pedras e terra com a obstinação de uma missão que lhe tivesse sido destinada, ou de uma maldição que não pudesse contornar. Rasgou com a pá o chão como se, ao fazê-lo, ele próprio entrasse no solo, imergindo por estratos de matéria repisada. Escavava e continuava a escavar, movia o peso de mil anos em cada grão de terra, reconstruía uma genealogia em cada investida do metal contra o chão. Contava os ossos de que é feita cada pedra, revelava o aglomerado de gente concentrada nesse pó.
E a cada movimento, o homem ia devolvendo ao sol o chão, revolvendo os corpos, as suas palavras, para finalmente as descobrir à luz.
O homem escavou e continuou a escavar: reconstruía a sua casa.

“Os ossos de que é feita é pedra” é um audio-walk criado em 2009 pelo Visões Úteis a convite da Fundación Cidade da Cultura e da Xunta de Galicia para as instalações da Cidade da Cultura em Santiago de Compostela. A Dramaturgia e Direcção são de Ana Vitorino, Carlos Costa e Catarina Martins. A Paisagem Sonora e Engenharia de Som de João Martins. A Intervenção Plástica de Inês de Carvalho. A Interpretação, entre outros, de José Barato, María Bouzas e Rocío González. E a Colaboração na Dramaturgia de Nuno Casimiro.

Sintam uma obra-prima feita com pedaços de lua roubados aos americanos. Guerras feias se travaram para a conseguir e agora aqui está, para os mais audazes. Para os mais afortunados. Esta obra genial é capaz das maiores proezas: basta que a tenham convosco. A peça que os reis quiseram ter e não puderam. Só há dez exemplares no mundo! Como é possível esta fantástica máquina de guardar momentos, meus senhores? Porque é um objecto especial. Feito de lua e de fibras raras, trabalhadas no monte mais alto do Ceilão. Sabe onde fica o Ceilão, minha senhora?
Não sabe, pois não? Fica longe, muito longe. Por baixo desta capa colorida, está uma massa rara, feita das mais mágicas pedras, a única peça feita com pedaços do xaile onde Maria Madalena chorou! Pois é, senhoras e senhores, o venturoso que a possuir pode conservar aqui os momentos mais felizes que já viveu. Não, não é um gravador de sons. Não serve para ouvir de novo as palavras. Serve para viver de novo a felicidade. Sim, que esta máquina só conserva momentos felizes: o dia em que o sol se pôs mais tarde, o momento em que. a sua senhora sorriu um pouco mais. Não há coisa igual no mundo. Cheguem-se, cheguem-se! Quem vai ser o felizardo?


Visões Úteis

O Visões Úteis (Porto, 1994) é um projecto artístico, de raizteatral, que se produz a si próprio, um projecto pluridisciplinar, marcadamente de autor e consciente da sua responsabilidade social e política para com as comunidades envolventes.
Nos últimos anos as dramaturgias originais dos seus responsáveis artísticos ganharam especial relevo e o projecto alargou-se a trabalhos sobre a paisagem urbana que têm conhecido uma progressiva internacionalização.
Desde sempre o projecto estético cresceu em sintonia com um forte sentido ético, numa constante reflexão acerca do sentido contemporâneo de fazer arte e teatro, que quotidianamente marca as opções de trabalho.
A Direcção Artística é de Ana Vitorino, Carlos Costa e Catarina Martins.